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Resenha: A Inovação Holográfica

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unnamedCharles Bezerra, designer, professor-doutor e conferencista, volta a falar de inovação em seu novo livro, A Inovação Holográfica, trazendo contribuições de pensadores que vão do físico David Bohm, ao escritor Aldous Huxley e ao educador Paulo Freire, do filósofo Wittgenstein a Ariano Suassuna, e muitos outros. Afinal, como ele mesmo define, a inovação precisa entre outras coisas de um sistema de ideias para se desenvolver. Como bom acadêmico, revela todas as suas fontes para aqueles que, curiosos, se sentirem provocados a buscar este conhecimento no original.

Sabe o efeito borboleta? – aquela teoria científica que uma ocorrência singular, não importa o quão diminuta, pode alterar o curso do universo para sempre – pois é, desse tipo de interconexão é que se está falando aqui. Tudo colabora para o sucesso ou insucesso da inovação e portanto deve-se levar em consideração o maior número de fatores direta ou indiretamente envolvidos. No livro, ele argumenta que a inovação não é um fato isolado, mas antes ela é dependente de cada parte envolvida, do contexto, da história, do momento, de um todo construído – de um ‘holos’ (em grego: ὅλος – o todo, inteiro, completo). Com isso ele defende que a inovação seja compreendida no seu aspecto ‘holográfico’, como um registro da totalidade. Segundo ele, inovar é “empacotar abstrações” – tornar explícito o conhecimento tácito e/ou implícito, acumulado por gerações, e portanto, nunca é um ato individual. Charles nos lembra o quanto que importantes inovações disruptivas foram muitas vezes no passado a consolidação de saberes ubíquos, de algo que surgiu porque as condições para isso estavam colocadas e irromperam frequentemente em mais de um lugar quase ao mesmo tempo. Foi assim com a fotografia, foi assim com o avião.

“Assim, o conceito da Inovação Holográfica sugere um novo jeito de pensar e realizar atividades de design; uma maneira de inovar que leva em consideração toda a complexidade e interdependência dos agentes, onde tudo está interligado, em movimento, e coisas aparentemente insignificantes podem fazer toda a diferença.”

Ao longo do livro, Charles aponta alguns elementos que movem e potencializam a inovação – não como fórmulas, mas antes como reflexões sobre como nos mantermos abertos. No capítulo final, propõe um modelo conceitual que permite enquadrar as empresas desde o patamar operacional mais elementar, no qual os fatos e objetos dominam, até o patamar filosófico – o mais elevado – aonde inovar é algo que naturalmente faz parte do sistema e não representa esforço adicional – acontece porque deve acontecer. O livro é portanto indicado para todos aqueles que procuram entender e refletir sobre o processo da inovação, seja no ambiente de projetos ou no ambiente empresarial. Além disso permite diferentes leituras e diferentes aprofundamentos, dada a riqueza de citações e referências que ele traz. Leia, inove – registrando o todo – holograficamente.

– Gabriel Patrocinio, fevereiro de 2017

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A Inovação Quântica

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A tarefa de explicar o fenômeno da inovação não é nada trivial. Nós ainda não temos uma teoria geral que explique todos os detalhes do fenômeno criativo da inovação. A quantidade de variáveis e fatores envolvidos é realmente imensa e as interações entre os agentes são bastante complexas. De alguma forma, inovação parece envolver as pessoas certas, com o jeito de pensar certo, no tempo certo e com os recursos minimamente suficientes para acontecer. Porém, a busca por melhores teorias para o fenômeno da inovação não pode parar. Explicações mais amplas e profundas para a emergência de inovações irão nos ajudar a potencializar nossa capacidade de solução de problemas, e quem sabe, nos ajudar a sair do atual estágio que nos encontramos, onde ao tentar resolver certos problemas acabamos criando mais e mais problemas.

Após alguns anos estudando teoria quântica, estou convencido de que um paralelo com os conceitos fundamentais da interpretação do físico e filosofo David Bohm pode em muito nos ajudar em nosso árduo desafio. Minha tentativa neste artigo é apenas introduzir os conceitos e sugerir este paralelismo, uma explicação mais intensa e detalhada é em que estou atualmente trabalhando.

Mas antes de explorar os conceitos da teoria quântica que podem ser úteis para uma teoria de inovação, precisamos falar sobre casualidade. Ou seja, a noção de que existem certas causas para certos eventos. A abordagem padrão da física quântica, conhecida como a interpretação de Copenhagen, defende a ideia do indeterminismo, também conhecido como o principio da incerteza de Heisenberg. Como os experimentos mostram a incapacidade de determinar ao mesmo tempo, a posição e velocidade de um elétron no nível sub-atômico, esta corrente defende que temos que aceitar o indeterminismo da realidade. Porém, existe outra interpretação que entende de forma diferente o misterioso comportamento das partículas no nível quântico, trata-se da teoria das variáveis escondidas defendida por David Bohm. Bohm, que era amigo de Einstein, não aceitava que indeterminismo era o caminho da realidade, mas que esta percepção é devida a nossa temporária ignorância. Uma vez conhecemos as variáveis escondidas, indeterminismo se torna determinismo. O filosofo da ciência Karl Popper dizia que todas as variáveis são inicialmente escondidas, e só deixam de ser assim quando as teorias que usam estas variáveis tem sucesso.

Acredito apesar de ser extremamente difícil prever o fenômeno da inovação, uma inovação não é um acidente. Alguém poderia dizer que inovadores não jogam dados. Mas, existem variáveis escondidas que uma vez conhecemos, somos capazes de explicar e determinar como aquelas variáveis levaram `aquela inovação.  Assim, nosso desafio é avançar no caminho de uma teoria de variáveis escondidas para inovação.

Resumir os conceitos fundamentais de Bohm em um artigo é uma tarefa quase impossível. Mas felizmente, o professor Kevin J. Sharpe conseguiu resumir as ideias da cosmologia e metafisica de Bohm em 5 grandes conceitos, os quais eu gostaria de explorar aqui e fazer um paralelo com inovação:

  1. A realidade possui uma profundidade infinita – a realidade, ou o contexto, nunca é exaustivo. Sempre haverá propriedades e qualidades além da nossa capacidade de entender. Uma teoria sobre algo é um insight limitado, pois todo objeto ou processo possui um infinito números de perspectivas.
  2. As partes da realidade se relacionam entre si – trata-se da ideia de que tudo está conectado a tudo e que é a totalidade que é fundamental. A visão de que podemos isolar e separar as partes é uma ilusão e provoca a fragmentação do nosso pensar, o que para Bohm é a causa de todo os nossos problemas.
  3. A totalidade e as partes da realidade estão em movimento – existe um holomovimento, onde tudo esta em constante mudança, em um processo de dobramento e desdobramento – ordens explícitas (a realidade como percebemos) e ordens implícitas (a arrumação que provoca/estabelece a realidade explícita); tudo é movimento, e qualquer tentativa de congelamento da realidade é artificial;
  4. O movimento da realidade é criativo – o holomovimento é criativo. “Não existem objetos, entidades, ou substancias, mas… tudo que é observável toma existência… se mantem estável por algum tempo, e assim deixa de existir”. Todo pedaço da realidade está constantemente se formando, reformando, transformando e deixando de existir.
  5. A realidade se divide em um sistema de hierarquias – existem níveis de hierarquia que a realidade respeita, onde a validade das leis em um nível não necessitam ir além do nível que pertencem. Um sistema de hierarquias de infinito numero de níveis, por exemplo o nível sub-atômico das partículas que obedecem as leis de probabilidade e o nível da nossa experiência diária é descrito pelas leis da cinética na mecânica clássica.

O paralelo que podemos fazer com estes conceitos para área de inovação é amplo e possui vários ângulos, mas claramente indicam um caminho mais fluido, onde a preocupação não está em isolar os elementos, ou as partes, mas está no todo, em como estas partes se relacionam. A emergência do fenômeno da inovação está na totalidade, em como as partes interagem. No padrão de interação entre os elementos do sistema de inovação (contexto, pessoas, recursos, cognição, cultura).

Algum progresso metodológico foi feito na área da inovação com a interação entre outras áreas, por exemplo, a incorporação de princípios oriundos das áreas do planejamento estratégico, da antropologia e do design, resultando na interpretação conhecida como design thinking. Porem, este ainda é um passo bastante limitado. O que eu gostaria de apontar aqui, é que podemos ir muito mais longe e alcançar interpretações muito mais profundas se interagirmos com varias outras áreas, como, por exemplo, a filosofia, a ciência cognitiva, a física, a biologia, a teoria da complexidade e teoria do caos, entre outras. Estas áreas também são divisões ilusórias, como dizia Popper “somos estudantes de problemas, não de disciplinas”.  Nosso problema é evoluir a maneira que resolvemos problemas.

Tudo isso parece ser amplo e abstrato demais, e longe de nossas profissões e da vida de nossas organizações, mas na verdade estes são caminhos conceituais capazes de mudar fundamentalmente tudo. Podem mudar nossos propósitos e nossos modos de operar – comunicação, estrutura organizacional, dinâmicas de aprendizado e de tomada de decisão. São conceitos que podem nos livrar do pensamento mecânico linear que estamos presos e permitir com que nossos resultados sejam coerentes com nossas intenções, algo que hoje raramente acontece.

Assim, precisamos encontrar as variáveis escondidas!

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Inovações Caóticas

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Muitas pessoas podem ficar surpresas em saber que todas inovações veem do caos, que inovação é na verdade um típico exemplo de um processo caótico. Porque caos é exatamente o que nós evitamos quando projetamos ou interagimos com um novo sistema. Mas, da mesma maneira que o caos cria furacões, rios, congestionamentos ou vasos sanguíneos também cria inovações.

O conceito cientifico de caos se refere a interconexão que está presente em eventos aparentemente aleatórios. Está relacionado aos padrões que não somos capazes de perceber, uma ordem que nós ainda não entendemos, ou como o grande físico teórico David Peat coloca “caos e chance não significa a falta de lei ou ordem, mas sim a presença de uma ordem que é tão complexa que está além da nossa capacidade de entender ou descrever”.

A teoria do caos nos ensina que as pequenas coisas importam. Que coisas aparentemente insignificantes acabam assumindo um grande papel a medida que o tempo passa. Que complexidade pode surgir da simplicidade da mesma forma que simplicidade pode gerar complexidade. Também nos ensina que a realidade não é tão binaria como estamos acostumados a pensar – mente e corpo, teoria e pratica, vida e morte, vencedor e perdedor, criativo e medíocre.

Caos nos ensina que tudo está em fluxo. Nós geralmente pensamos tudo em termos de estágios de um inicio para um fim. Nós cegamente acreditamos em nossos planos. Que nós planejamos, executamos e medimos tudo em sequencia, e que ao final de um plano e sua implementação tudo acaba e fica perfeito. Nós simplesmente não estamos acostumados a pensar em ciclos e fluxos.

Inovação não é um evento aleatório. Ainda que tenha muitas variáveis e seja imprevisível, fundamentalmente inovação envolve a descoberta de uma nova ordem. Inovação é uma ordem que emerge em nossas cabeças. Não emerge na tecnologia ou nos processos, mas até então, apenas nas mentes das pessoas. Assim, inspirado pela natureza caótica de nossas mentes eu gostaria de sugerir três coisas ‘práticas’ que eu acredito pode nos ajudar a perceber novas ordens e inovar com mais frequência.

Primeiro, mais tempo para nossas mentes – mais tempo para pensar. Eu vejo as pessoas em grandes organizações cada vez mais ocupadas com atividades mecânicas que envolvem competências analíticas mas não ajudam a ir fundo nas questões e no desenvolvimento de competências conceituais. A maior parte do nosso tempo é gasto em e-mails e reuniões. Nós temos que entender que pensar também é trabalho.

Segundo, sensibilidade para pequenas coisas – com mais tempo para pensar temos que desenvolver uma profunda sensibilidade para perceber as motivações e os níveis de energia das pessoas; assim como sensibilidade para sentir o contexto. Para reduzir o atual nível de ansiedade e alcançar um estado de alerta capaz de perceber as nuances e sutilezas do sistema.

E por último, humildade – com mais tempo para pensar e mais sensibilidade nós veremos quão pouco nós sabemos. E assim, devemos nos tornar mais humildes e estar mais preparados a viver com duvidas e incertezas. Também, precisaremos desenvolver mais honestidade e estar mais preparados para colaborar e dialogar com os outros. Pois, a mais importante lição do caos é exatamente esta, que em um nível mais profundo, tudo está conectado a tudo.